SCSBRS126 Dueto
Apresentação
A Epagri – Estação Experimental de Itajaí (EEI), preocupada com as questões
relativas às mudanças climáticas e consequente aumento da frequência de temperaturas
extremas, iniciou em 2008 estudos na área de tolerância de arroz ao frio na fase
reprodutiva. Apoiaram as pesquisas iniciais o CNPq, com o projeto 402214/2008-
0, intitulado “Desenvolvimento de cultivares de arroz para sistema irrigado visando
a obtenção de tolerância a estresses bióticos e abióticos” (2009-2012), e a Fapesc,
através do projeto 6980/10-9 (Chamada Pública 12/2009) – “Avanços tecnológicos em
arroz irrigado para a Região do Alto Vale do Itajaí” (2010-2012). Cabe registrar que
a busca de variedades resistentes foi uma demanda do Alto Vale do Itajaí, defendida
principalmente pelo Sr. Antônio Carlos Contezini, que apoiou a Epagri na condução de
experimentos e unidades de observação na região. Como resultado desses esforços, a
Epagri, em conjunto com a Embrapa e apoiada pela UDESC/CAV, disponibiliza, para a
safra 2023/2024, seu 26o cultivar de arroz irrigado para Santa Catarina, o SCSBRS126
Dueto (RNC/MAPA no 48358, de 8/7/2021, e SNPC/MAPA no 20230006, de 20/09/22-20/9/37) (Figura 1A e 1B).
O nome “Dueto” é alusivo à parceria interinstitucional entre Epagri e Embrapa e
à dupla aptidão do novo cultivar, que é tolerante a baixas e altas temperaturas na fase
reprodutiva. Finalmente, o nome “Dueto” visa reconhecer dois ilustres pesquisadores,
cujas contribuições para a orizicultura brasileira foram relevantes, e aos quais este
lançamento é dedicado, a saber: o Eng.-Agr. Dr. Orlando Peixoto de Morais (in memoriam),
da Embrapa Arroz e Feijão, e o Eng.-Agr. Me. Richard Elias Bacha, pesquisador emérito
da Epagri.
Figura 1. SCSBRS126 Dueto (safra 2019/20) (A); plantas individuais
individuais (transplantadas) apresentando ótimo perfilhamento (B)
Foto: Rubens Marschalek
Origem e particularidades:
A linhagem SC 806, lançada como SCSBRS126 Dueto (Figura 2), foi desenvolvida
pelo Programade Melhoramentode ArrozIrrigadoda Epagri em parceriacoma Embrapa.
O novo cultivar é oriundo do cruzamento entre o cultivar IRGA 424 e a linhagem da
Embrapa BRA040081 (BRS Pampa). A hibridação foi realizada em 2008 pela Embrapa
Arroz e Feijão e a multiplicação das sementes F1
foi realizada em 2009 (Goianira, GO),
na Estação Experimental Palmital (EEP). A geração F2
foi conduzida na Epagri – EEI
(2009/10) e em 2010/11 as famílias F2:3 foram avaliadas no Ensaio de Observação de
Famílias (EOF) na EEP e no Ensaio F2:3 na EEI, sendo selecionadas cinco famílias, que
foram avançadas para o Ensaio de Rendimento de Famílias F2:4 (ERF) e avaliadas na safra
2011/12 em Alegrete/RS, Capão do Leão/RS, Santa Vitória do Palmar/RS e Itajaí/SC, nos
quais a família CNAx16810-B-7-B se revelou promissora. Posteriormente, as avaliações
continuaram somente na Epagri, que levou essa família à fase F5
(2012/13) sendo em
2013/14 e 2014/15 (EEI) avaliada em ensaios avançados F6, recebendo a denominação de linhagem SC 806.
Em experimentos de seleção fenotípica conduzidos em campo no outono, na
EEI, a SC 806 foi considerada promissora. Diante disso, foi inserida em experimentos
de primavera-verão a 600 m de altitude (Rio do Campo, SC) de 2014/15 até 2015/16,
e a 500 m de altitude em 2016/17 (Mirim Doce, SC). O desempenho da linhagem foi
promissor nesses sítios de altitude, e, assim, ela foi inserida nos ensaios de Valor de
Cultivo e Uso (VCU) em 2017/18, nos quais permaneceu até 2021/22.
A partir de 2013 foram conduzidos, na EEI, em parceria com o programa
de pós-graduação do Centro Agroveterinário da Universidade do Estado de Santa
Catarina – UDESC, vários experimentos em câmara de crescimento controlado, com o
monitoramento da temperatura, luz e umidade. Estas pesquisas confirmaram a
resiliência da SC 806 não somente às baixas (15-17°C), como também às altas
temperaturas (até 38°C). Entretanto, cabe ressaltar que observações de campo e
estudos preliminares demonstram que o SCSBRS126 Dueto não apresenta tolerância
ao frio na germinação, estabelecimento e fase vegetativa.
Figura 2. Grãos brancos descascados e
com casca do SCSBRS126 Dueto
Foto: Rubens Marschalek
Regiões de adaptação, características e considerações gerais:
O cultivar
SCSBRS126 Dueto foi avaliado nas áreas representadas pelos ensaios
VCU e aprovado para cultivo de arroz irrigado pré-germinado de Santa Catarina, sendo
indicado principalmente para regiões com altitude superior a 400m, sujeitas a quedas
de temperatura na fase reprodutiva do arroz, pois apresenta menores índices de
esterilidade de grãos sob frio quando comparado a outros cultivares da Epagri (Figura
5A e 5B). A extensão de uso para o RS, em semeadura em solo seco, foi solicitada em
2023 (com base em VCUs da Embrapa).
O
SCSBRS126 Dueto tem excelente perfilhamento em baixas altitudes, e
seu crescimento na fase vegetativa é um pouco menor em altura do que o de
outras variedades da Epagri. Tem colmos de espessura médio-fina (˂ 4,1mm) e,
aproximadamente 15 dias após o florescimento estes podem adquirir dobras nos nós
(“joelho”), o que pode emprestar à lavoura um aspecto de remexida e entrelaçada, não
raro, de “encostada” (Figura 3). Dependendo do clima e local de cultivo, bem como da
densidade de semeadura, isto pode não ocorrer ou ser apenas sutil, conferindo à lavoura
uma aparência ereta normal (estiolada), agravando sua pré-disposição ao acamamento.
A folha-bandeira é curta e pouco expressiva, e seu ângulo em relação ao eixo
vertical, até o florescimento, é totalmente ereto; mas após essa fase, pode torna-se
intermediário (aprox. 45º) (Figura 4) e, talvez por isso, seja eventualmente alvo preferido
de pássaros. Semeaduras com densidade ≥120kg/ha (exceto nas regiões de altitude,
onde esta cifra está sendo estudada, e pode ser maior) ou muito tardias (nov-dez), ou
cultivos com adubações desequilibradas (excesso de nitrogênio, por exemplo) podem
alterar bastante a arquitetura e estrutura da planta.
Tudo isso, aliado ao ótimo potencial produtivo desta variedade, acrescido
ou não de eventuais agravantes climáticas (ventos e chuvas fortes), pode aumentar
sua predisposição ao acamamento, principalmente em altitudes inferiores a 400m.
No sistema pré-germinado, o manejo requer muita atenção, eventualmente com
drenagem intermediária no perfilhamento, adubação de acordo com a análise do solo
e acompanhamento técnico criterioso. No sistema de semeadura em solo seco, nos
dois anos de VCUs realizados no RS, não foram relatados episódios de acamamento. Já
no pré-germinado, especialmente nas regiões de baixa altitude, há a necessidade de
precauções no manejo, no que diz respeito ao risco de acamamento.
Quanto à seletividade do cultivar
SCSBRS126 Dueto aos principais tratamentos
herbicidas utilizados em arroz irrigado, em sistema pré-germinado, comparativamente
aos cultivares SCS116 Satoru, SCS121 CL, SCS122 Miura e SCS125, o novo cultivar
apresenta boa seletividade aos herbicidas mais comumente utilizados em sistema prégerminado (florpirauxifen-benzil, penoxsulam, carfentrazona-etílica), aplicados em
pós-emergência, para a semeadura realizada tanto em agosto como em outubro (de
acordo com experimentos da safra 2022/23). Apresenta também boa seletividade para
6
a aplicação em pré-emergência de clomazone na dose recomendada e sem o uso de
protetor de sementes, em sistema pré-germinado (estádio S3), em área com solo bem
nivelado, nas semeaduras de agosto e outubro.
O
SCSBRS126 Dueto pode apresentar alguma desuniformidade de maturação
dos grãos na panícula ou na planta. Observações preliminares indicam que este cultivar
não tem boa capacidade de rebrota.
Quanto ao desempenho industrial e sensorial, o SCSBRS126 Dueto foi testado
no laboratório LabGrãos/UFPel (Certificado Nº 042I de 03/9/2020) e avaliado para
arroz branco e parboilizado no Lab. de Qualidade da Urbano Agroindustrial, enquanto
na Epagri/E.E. Itajaí foi avaliado para arroz branco. Apresentou bom desempenho
sensorial e culinário para arroz branco, sendo considerado adequado à parboilização.
Foi avaliado quanto à amilose e temperatura de gelatinização na Embrapa Arroz e Feijão
e na Unidade de Ensaios Químicos e Cromatográficos da EEI (UENQ/Epagri).
Figura 3. Lavoura de SCSBRS126
Dueto vista de cima na maturação
Foto: Rubens Marschalek
Figura 4. Lavouras de Semente Básica (transplantada) de SCSBRS126
Dueto na maturação (esquerda) e durante enchimento de grãos (direita)
Foto: Rubens Marschalek
O cultivar SCSBRS126 Dueto* destaca-se por apresentar:
- ciclo tardio (142 a 144 dias*);
- excelente perfilhamento (porém, colmo fino; médio-suscetível a acamamento);
- excelente produtividade (mas exige nutrição adequada e equilibrada);
- menores índices de esterilidade** sob estresse de temperatura (baixa e alta)
na fase de formação dos grãos de pólen (microsporogênese)*** e floração (antese)*** ;
- boa qualidade de grãos;
- boa aparência e qualidade sensorial para arroz branco;
- adequado à parboilização.
*De acordo com condições edafoclimáticas e de manejo/industrialização pode
haver alterações, como ocorre com qualquer variedade (cultivar).
**O que se traduz por menores índices de esterilidade: válido para condições
controladas de umidade, temperatura e fotoperíodo. Avaliações feitas em câmara de
crescimento controlado, sob baixa temperatura diurna (17ºC e 65%UR) durante 3 dias de
exposição na microsporogênese/antese, e alta temperatura diurna (38ºC e 55%UR) por
4 dias na antese (floração). Bom desempenho em nível de campo em sítios de elevada
altitude (entre 500m e 600m), em Santa Catarina, no Alto Vale do Itajaí (publicações dos
congressos CBAI em
https://www.sosbai.com.br/trabalhos/).
***A fase da microsporogênese em R2 é caracterizada considerando a distância
da lígula da folha-bandeira e da penúltima folha entre -3 cm (lígula da folha-bandeira
abaixo da lígula da penúltima folha) e +10cm (lígula da folha-bandeira acima da lígula
da penúltima folha). A antese em R3-R4 é caracterizada pela exserção da panícula e
abertura das espiguetas.
Figura 5. Foto ilustrativa da menor esterilidade no SCSBRS126 Dueto (A), comparada à esterilidade
do SCS122 Miura (B), após ocorrência de frio no período reprodutivo (VCU 2019/2020 em
Araranguá, SC)
Características agronômicas (A) |
Produtividade média (kg/ha) |
10.290* |
Produtividade potencial estimada (kg/ha) |
13.695** |
Estatura - comprimento colmo (cm) |
75,9*** - 87,4**** |
Panícula – comprimento (cm)**** |
25,7 |
Espessura do colmo (mm) **** |
4,10 |
Comprim. folha-bandeira (cm) **** |
33,6 |
Vigor inicial e perfilhamento |
bom |
Ciclo biológico (em SC) |
tardio |
Emergência a maturação (dias) (D) |
142*** - 144**** |
Toxidez por ferro indireta (alaranjamento) e direta |
Médio-suscetível (nota 5,7) |
Brusone |
Médio-resistente |
Escaldadura da folha |
Médio-suscetível |
Mancha parda |
Médio-suscetível |
Mancha de grãos***** e Falso carvão |
Médio-suscetível |
Podridão-da-bainha |
Suscetível |
Degrane |
Intermediário |
Folha-bandeira |
Ereta |
Exserção da panícula |
Completa |
Pilosidade da folha |
Média |
Acamamento: ≥ 400 m altitude |
Médio-suscetível |
Acamamento: ≤ 400 m altitude |
Suscetível |
Características do grão (A) |
Classe |
Longo-fino |
Arista e microarista |
Rara e curta |
Peso 1.000 grãos com casca (g) |
27,3**** - 27,7*** |
Pilosidade |
Escassa |
Cor das glumas |
Palha |
Comprimento do grão polido (mm) |
7,09*** - 7,14**** |
Largura do grão polido (mm) |
1,99*** - 1,92**** |
Espessura do grão polido (mm) |
1,73*** - 1,67**** |
Relação comprimento/largura (C/L) |
3,5*** - 3,7**** |
% de longo finos |
19,7*** |
Teor de amilose (%) (B) |
24,28 (intermediário) |
Temperatura de gelatinização (B) |
6,98 (baixa) |
Centro branco (0 a 5) (C) |
2 |
Área gessada / Grãos gessados (%) |
3,31*** / 5,08*** |
Indicativos industriais/sensoriais |
Renda - branco (%) |
67,9** |
Grãos inteiros - branco (%) |
60,0** |
Grãos quebrados - branco (%) |
7,9** |
Grãos inteiros (%) (gelat.) 0,9 kgf/cm2 (E) |
68,84±2,79 |
Renda (%) (gelat.) 0,9 kgf/cm2 (E) |
70,30±2,03 |
Análise sensorial (em arroz branco) |
Adequado |
Processo de parboilização |
Adequado |